O meu primeiro artigo para esta revista abordava a estrutura e articulação do nosso Sistema Nacional de Saúde (SNS), e em particular, formas de optimizar a qualidade e eficácia do mesmo. A ideia de transferir o financiamento do SNS para os utentes despertou um grande atrito por parte de algumas pessoas. Muitos concordaram com a ideia de haver mais autonomia para cada hospital, de haver mais competição no sector e que o utente possa ter mais liberdade para escolher os serviços que mais deseja. Porém, a simples ideia de cada um pagar pelas suas despesas não foi bem aceite. Muitos concordaram que até poderia contribuir para a eficácia do sistema de saúde, porém, seria um método desigual que levaria a uma privatização do SNS, aproximando-nos do tenebroso sistema de saúde americano onde cerca de 46 milhões de pessoas não têm seguro de saúde.
Pouco tempo depois, vim a saber que o Governador do Estado de Massachusetts, o presidenciável Mitt Romney, propôs uma grande reforma na área da saúde naquele estado baseando-se num pressuposto simples: todos os residentes naquele estado norte-americano devem possuir seguro de saúde. De uma forma simplificada, todas as pessoas que tenham capacidade para usufruir de um seguro de saúde devem adquiri-lo, sendo penalizadas caso não o façam. Para os mais necessitados, o governo contribuirá com um fundo especial. A lei entra apenas em vigor em Julho de 2007, logo, ainda teremos que esperar algum tempo até possuirmos dados que avaliem o sucesso desta medida.
Se esta proposta resolve alguns problemas de um sistema de financiamento estatal, nomeadamente o escalar da dívida pública na área da saúde, também é verdade que levanta outros. Por um lado as dificuldades na sua aplicabilidade (existe o risco de aumentar a burocracia no sector), e por outro, a maior vulnerabilidade a que o cidadão fica sujeito, em termos de escolhas.
Na minha opinião, esta proposta ainda acarreta algumas deficiências, mas serve para demonstrar o rumo que terá de ser seguido no futuro: O Estado deve transferir directamente para os cidadãos as responsabilidades do pagamento do sistema de saúde (SS). A interface cidadão-Estado-SS deve ser progressivamente substituída pela interface cidadão-SS. Esta é que deve ser a base de uma verdadeira política de saúde. Só depois de construída a base do sistema, é que é possível modelar o topo da estrutura de modo a abranger aqueles que não estão incluídos no sistema. Não faz sentido trabalhar no sentido oposto.
Não pretendo com este texto descrever todos as componentes de um modelo de saúde, mas sim promover o debate de outras alternativas para um saudável sistema de saúde. Em certa medida, a mudança “cultural” de certos aspectos deste tema, é tão importante como as próprias alterações políticas. É necessário compreender que pode existir um bom sistema de saúde, sem este ter que estar obrigatoriamente sobre a alçada do Estado. E não nos esqueçamos que a habitual tendência para criticar a desigualdade de um modelo é, por vezes, mal diagnosticada e tratada. Por vezes, em vez de uma elevada dose de subsíduos, que geralmente não resolvem o problema, basta uma pequena dose de responsabilidade individual.
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